Em tempos de crise e recessão, I, Daniel Blake (Eu, Daniel Blake, no Brasil) é um filme que merece ser discutido. Vencedor da Palma de Ouro em Cannes, me atrevo a dizer que é o mais complexo longa do veterano Ken Loach, que demonstra um incrível domínio narrativo e muita maturidade ao colocar o peso da história nas costas do desconhecido Dave Johns.
Newcastle, Inglaterra. Daniel Blake (Johns) acaba de receber a notícia de que deve parar de trabalhar por um período indeterminado por conta de um problema no coração. Ele é um cidadão honesto, que paga seus impostos e que trabalha duro para manter seu padrão de vida – humilde, mas decente. Ele vai atrás de uma agência do governo para assinar o benefício social de saúde, mas descobre que tudo depende de internet – um desafio, já que ele não tem contato algum com o computador. Ao mesmo tempo que tenta superar a burocracia do governo, ele acaba esbarrando em Katie (Hayley Squires). A moça, que chegou de Londres, não tem dinheiro para pagar a conta de luz e nem mesmo a alimentação de seus filhos. Nessas duas histórias, busca-se abordar os altos e baixos dos dois, na tentativa de convencer o governo de que eles são mais que números.
É em Johns que Loach entrega o peso do filme. com uma mensagem é bombástica e eficiente. A seleção pelo ator deixa clara a ideia de tocar o filme a partir de uma interessante proposta: Daniel Blake poderia ser qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo que se sente humilhada pelo sistema, que desfavorece justamente os mais necessitados. Se um ator renomado interpretasse o personagem, certamente o impacto seria menor. É no poço da incerteza que Johns empresta seu rosto para protestar em nome de todos aqueles que são vítimas.
É certo que a trama contem exageros, mas eles são justificados pela forma bem humorada com que o personagem parece lidar com tudo durante o filme. A experiência final, portanto, é base para um drama alternativo, com ótimas gags, mas que sabe bem a hora de falar sério e tratar de situações cotidianas, como a prostituição como única saída para compra de alimentos. Em minha sessão de I, Daniel Blake. no Festival do Rio, além dos aplausos, muitos espectadores aproveitaram para protestar contra a recente aprovação da PEC 241. De certo modo, é esse o maior legado de Loach, fazendo seu público adaptar a situação para as peculiaridades de determinado país, mostrando que a luta do Estado contra os mais pobres também é globalizada.
* Filme visto no Festival do Rio 2016
NOTA: 8/10
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