Um filme sobre jornalismo, que trata do dia a dia de uma investigação que leva aos leitores uma reportagem bombástica. Durante toda minha vida, All the President’s Men foi a recomendação certeira, afinal, Robert Redford e Dustin Hoffman foram brilhantes em uma produção que cutucava uma ferida aberta nos americanos (Watergate e a renúncia de Richard Nixon). Spotlight (Spotlight – Segredos Revelados, no Brasil) vem para competir lado a lado com o filme de Alan J. Pakula – e certamente será obrigatório em todas as faculdades de jornalismo mundo afora.
Tom McCarthy é um homem versátil: se sua carreira como ator não deslanchou (ainda assim ele insiste em participações esporádicas), certamente Spotlight é o empurrão que faltava para ele seguir adiante por trás das câmeras. Encarregado do roteiro de Up, uma das grandes animações do início deste milênio, em 2013 ele finalizou junto de Josh Singer o roteiro que tratava sobre os abusos sexuais de menores cometidos por padres da Igreja Católica de Boston, história que apenas veio a tona graças a incansável investigação da equipe do jornal The Boston Globe. Após receber várias negativas para financiamento, Hollywood selecionou a história em sua black list de 2013 (lista de roteiros que mais agradam os produtores mas que ainda não viraram filme) e não demorou para a Open Road Films montar a proposta de tocar o longa em torno de uma cifra de vinte milhões de dólares. Este número torna-se notório a medida em que observamos o perfeccionismo de McCarthy ao longo do filme e também na excelente seleção de atores.
No ano de 2001, com a Internet ameaçando de vez o domínio dos jornais impressos, a direção executiva do The Boston Globe decide contratar um novo editor, Marty Baron (Liev Schreiber). Após anos de sucesso no Miami Herald, ele busca repetir a fórmula reorganizando toda a redação. Em uma de suas primeiras reuniões, ele descobre que um dos destaques da casa, Walter “Robby” Robinson (Michael Keaton), comanda a equipe Spotlight, responsável por realizar matérias especiais, que permaneceriam na boca do povo. Junto de seus colegas Mike Rezendes (Mark Ruffalo), Sacha Pfeiffer (Rachel McAdams), e Matt Carroll (Brian d’Arcy James), Robinson segue a dica de Baron e retoma uma matéria que nunca teve grande cobertura da mídia da cidade: o encobertamento da Igreja Católica nos casos de abusos por parte de padres e bispos. Inicialmente, a equipe trabalha com o número de quatro casos, que logo se tornam treze e mais tarde chegam a incríveis 90. Mesmo em meio ao caos do ano mais difícil da história recente dos Estados Unidos, por conta do 11 de setembro, Robinson aposta no potencial da história, naquele que se tornaria um dos grandes casos jornalísticos daquele país.
McCarthy passa com extrema eficácia a dificuldade de lidar com a instituição mais poderosa do mundo – justamente na cidade em que ela tem maior abrangência em solo estadunidense. Os acordos das vítimas com os advogados que representam a Santa Sé, os misteriosos termos de confidencialidade e mesmo a influência da religião na justiça local mostram ao espectador o tamanho da dificuldade das pessoas envolvidas no caso. Não bastaria apenas acusar a Igreja, era necessário provas e mais provas, até pelo fato de mais da metade dos leitores do Globe serem de fé católica. Como em um bom caso de mistério, aos poucos as peças se encaixam. Nada graças a um toque de mágica, mas sim de trabalho duro que envolve entrevistas, informantes, atritos e reuniões de pauta.
A grandiosa produção tem seu maior mérito na perfeita divisão de tarefas. Keaton, Ruffalo e McAdams alternam com bastante precisão o peso de tomar frente a história. Cada um tem seus altos e baixos – e são nos momentos difíceis que a equipe busca se unir em torno do desejo de mostrar para a cidade a verdade. Schreiber atua como um coadjuvante de peso, dando o suporte mental e racional, já que existe a tensão emocional dos jornalistas da cidade em averiguar um fato que estava debaixo de seus narizes. Por mais estranho que possa parecer, ambientar 2001 no cinema não é tão fácil quanto se imagina. Desde o panorama geral (carros, vestuário) até o tecnológico (computadores, celulares) fica claro que ouve um interesse de resgatar o começo do século com bastante propriedade, em uma fotografia bastante sólida de Masanobu Takayanagi.
Spotlight dá um panorama geral do caso nas suas duas horas de rodagem e certamente tem força o suficiente para inspirar redações de qualquer canto deste planeta. A história por trás de um escândalo começa nas pequenas pistas. Basta um bom suporte, tempo e dedicação para montar o caso. Principal concorrente ao Oscar de melhor filme e premiado merecidamente com o troféu Robert Altman (Spirit Awards), é o tipo de filme que prende o espectador do começo ao fim contando a realidade nua e crua através de atuações de luxo de seus ótimos protagonistas.
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NOTA: 9/10
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