“Cientologia é como uma jornada na mente de L.R Hubbard. O quanto mais você se aprofunda nisso, mais parecido com L.R Hubbard você se torna”.
Milhares são as dúvidas em torno da Cientologia. O fato é que seu poder simbólico é incontestável: milhares de templos de luxo em Hollywood, suporte de magnatas da indústria cinematográfica, suporte de celebridades como Tom Cruise e John Travolta. Qual é a mágica por trás disso? Melhor: o que a Cientologia tem de tão especial e diferente? Alex Gibney é um dos documentaristas mais respeitados nos Estados Unidos – e graças a curiosidade despertada pelo livro Going Clear: Scientology, Hollywood, and the Prison of Belief, escrito por Lawrence Wright, foi em busca de um panorama completo sobre a fonte de poder que domina os territórios nobres de Los Angeles.
Assim como em seu maior sucesso – Taxi to the Dark Side – Gibney dá uma contextualização impecável sobre o tema que busca abordar. Tomo meu caso como exemplo: apesar de já ter caminhado na frente das enormes construções da Igreja da Cientologia em Hollywood, tinha pouca ideia sobre sua concepção teológica, ou mesmo sobre o seu livro regente, sua visão de Deus, do mundo em geral, entre outros. Going Clear tem como chave para o sucesso explicar detalhadamente cada processo desde a entrada de uma pessoa neste Igreja, e faz isto, inicialmente, colocando em análise a figura do polêmico L.R Hubbard – o que me fez valorizar ainda mais a interpretação de Philip Seymour Hoffman em The Master. Neste sentido, o fundador da Igreja é visto pelo documentarista como um charlatão que mentiu para sua esposa, não se preocupava em pisar em cima de amigos para atingir objetivos e teve seu estouro graças a uma obra bizarra sobre o poder da mente humana. Com uma grande experiência em revistas Pulp, Hubbard colocou em prática suas escritas de ficção em uma religião cuja base é desconhecida mesmo para aqueles que frequentam o local há cinco anos, por exemplo.
O documentário poderia apenas se sustentar nas graves acusações da obra de Wright, como a de que a Cientologia estava por trás da briga dos filhos de Tom Cruise e Nicole Kidman com sua mãe, o fato de a Igreja ter moldado Nazanin Boniadi para ser a futura esposa de Cruise e mesmo a grande operação montada pela organização para abafar os rumores da homossexualidade de John Travolta. Apesar de tudo isso ser parte fundamental do filme, Gibney vai além: ele reuniu mais evidências e descobriu, por exemplo, que a Cientologia grampeou as linhas telefônicas de Kidman após ela ser considerava uma pessoa ‘subversiva’. O mais interessante de tudo, no entanto, é que cada um destes casos é apenas uma pequena peça quando temos em conta o gigantesco horizonte de brigas, calúnias e todos os tipos de violações de direitos humanos cometidos dentro das instalações da Igreja da Cientologia.
A riqueza do documentário tem como bases o amplo uso de vídeos da Cientologia, seja de entrevistas de Hubbard ou mesmo de shows para esbanjar o poder de Miscavige, sucessor do fundador da Cientologia após sua morte, em 1986. Graças ao fair use, Gibney conseguiu moldar suas falas e passagens do livro de Wright com palavras direto das bocas dos principais homens por trás desta Igreja, o que é surpreendente, em primeiro momento, e depois vira a cereja no bolo a medida em que mais e mais denúncias são reveladas. O documentário ganha uma credibilidade ímpar ao entrevistar pessoas de peso dentro da Cientologia, que deixaram a organização justamente pelos abusos de Miscavige. É surpreendente observar como a Igreja organizou uma equipe para silenciar seus dissidentes – usando informações obtidas através de um aparato de inteligência de dar inveja a qualquer diretor de filmes de espionagem.
Going Clear é um dos mais completos documentários deste século. Curiosamente, sua primeira sessão não foi para críticos ou para executivos, mas sim para advogados: aliás, 160 deles. A equipe da HBO preocupou-se com a repercussão das graves revelações e temeu por um processo multimilionário. Talvez por isso, Gibney não se atreveu a tocar em outras ‘bombas, como no desaparecimento da mulher de Miscavige e na estranha morte do filho de Hubbard. A nomeação de Going Clear para o Oscar seria tranquila – e certamente este documentário apareceria como grande favorito – se não fossem dois motivos: 1) O renovado campo de aptos a votar para esta categoria têm errado feio em suas escolhas (a ausência de Life Itself ano passado foi imperdoável!) ; e 2) a Igreja da Cientologia já começou a pressionar seus contatos em Hollywood para barrar qualquer tipo de indicação ao Academy Awards. No entanto, cabe ressaltar que a HBO e Gibney foram venceram três prêmios Emmy – o que já é uma boa indicação.
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NOTA: 9/10
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