Spalovac mrtvol (O Cremador, no Brasil) é um filme que apresenta um lado do cinema tcheco que até então estava fora do alcance do público. Com uma história carregada de humor negro ambientada em um dos períodos mais turbulentos da história da Tchecoslováquia.
Com muito orgulho, Kopfrkingl (Rudolf Hrusínský) comanda um pequeno crematório na cidade de Praga. Com o avanço da Alemanha Nazista e a ameaça de invasão e ocupação do regime de Adolf Hitler, aos poucos o homem é persuadido a se unir ao Partido Nazista e adotar a ideologia alemã. E é nessa conversão que ele revela seu lado sombrio – não poupando nem mesmo sua família.
O mais interessante deste filme é a forma com que o roteiro é construído. Aos poucos entramos na vida desta pacata família e observamos como o protagonista é suscetível as influências externas. Ele deixa de apenas ver sua tarefa neste mundo como a libertação das almas para se colocar à disposição dos nazistas para levar a cremação a um nível completamente diferente. Egomaníaco, Kopfrkingl não aceita críticas ao seu trabalho e passa a planejar cuidadosamente cada passo em direção ao que chamava de “indústria da cremação”.
A fotografia em p/b apresenta tons cartunescos que deixam claro que o filme não é somente um drama de guerra ou um thriller. Os produtores apostaram na mescla destes gêneros com uma crítica a elite tcheca da década de 1930, a mesma que fechou os olhos para Hitler e aplaudiu de pé a anexação. Isto fica evidente em uma memorável cena onde Kopfrkingl é cumprimentado pela primeira vez com a saudação nazista, e coloca um sorriso enorme no rosto ao retribuir seus colegas com o mesmo gesto.
Recomendo vivamente ao leitor que se interessar por este longa dar uma lida em minhas outras críticas sobre os filmes da New Wave tcheca (mesmo que não tenha visto nenhum deles). Acredito que a contextualização do período seja algo fundamental para o entendimento do quanto o diretor Juraj Herz arriscou ao romper com o padrão comunista (exaustivamente discutido aqui no site). O filme foi lançado em alguns cinemas de Praga e marcaria o começo do fim da New Wave, já que aos poucos os censores do novo governo de Gustáv Husák passaram a interferir diretamente sobre os novos projetos da indústria cinematográfica do país.
NOTA: 6/10