Após a tomada comunista na Tchecoslováquia, por duas décadas o cinema deste país ficou preso pela censura soviética. O regime de Stalin ordenou aos diretores um alinhamento total com o regime, e as películas financiadas pelo governo eram voltadas, quase em sua totalidade, para a exposição de temas diretamente ligados com o socialismo. Nos anos finais do governo de Nikita Khrushchov pode-se notar um relaxamento total destas exigências, que fica escancarado a partir do momento em que Leonid Brejnev chega ao poder. Os soviéticos decidiram controlar apenas o cinema russo, considerado como o mais influente, e deixou de lado os demais satélites. No caso tcheco, a escola de cinema de Praga (FAMU), uma das mais tradicionais da Europa, tornou-se referência para diretores como Miloš Forman e Jiří Menzel, que decidiram aproveitar as brechas para criticarem – ainda que de forma indireta – a opressão comunista. A chamada New Wave surgiu em 1962 com o filme Slnko v sieti / The Sun in a Net (sem lançamento e título em português), nosso alvo de análise.
Bela (Jana Beláková) e Fajolo (Marián Bielik) acompanham o eclipse solar no topo de um prédio da cidade de Bratislava. O casal de namorados não possui uma relação muito boa, já que as brigas e as ofensas do rapaz incomodam muito a moça, que sofre com a perda de visão de sua mãe. Os dois tomam caminhos distintos, desfrutam de novas experiências e usam deste tempo como uma ferramente para refletir seus comportamentos e objetivos.
Dirigido por Stefan Uher – graduado na FAMU em 1955 – o filme é revolucionário em vários aspectos: além de ser o primeiro a tratar de temas considerados tabu em seu período (jovens trocando de parceiros, más condições de trabalho no campo, suicídio e quebra do laço familiar através da traição), a estrutura narrativa diferencia-se não apenas do padrão adotado pelos filmes deste país até então, mas também da New Wave francesa, uma vez que todo o roteiro é montado a partir de vários fragmentos de várias situações dramáticas que ganham corpo com o passar do tempo. Além disso, também deve-se mencionar que esteticamente o filme rompe com os soviéticos ao mostrar uma mulher em trajes de banho muito ousados e algumas cenas bem quentes de beijos (inspiração vinda de Michelangelo Antonioni).
A história não é fantástica, longe disso. Tem problemas comuns de seu período, especialmente no que diz respeito ao toque do filme (os tchecos sempre foram criticados por não conseguir sustentar um clímax cinematográfico). A separação do casal protagonista não é tratada com atenção pelo fato do diretor estar mais preocupado em sustentar suas histórias paralelas para fazer um fechamento geral que traga um pouco de satisfação ao espectador.
Desconhecido do grande público, The Sun in a Net oferece um bom retrato do que viria pela frente. Algumas das polêmicas decisões dos produtores passaram batido pelos censores soviéticos, o que levou uma série de diretores a copiarem o modelo. Apesar do governo do presidente Antonín Novotný se posicionar contra a maioria das produções do período New Wave, jamais houve uma tentativa de desestabilizar as produções ligadas à FAMU. Era o começo de uma das eras mais brilhantes da história do cinema mundial.
NOTA: 7/10