Terminamos este mês dedicado ao grande Akira Kurosawa no site com a análise de Dreams (Sonhos, no Brasil), um dos últimos longas dirigidos pelo diretor japonês. Segundo ele, todas as histórias presentes neste longa são frutos de seus sonhos. Dentre pesadelos macabros e contos emocionantes, a fotografia é o grande destaque da produção financiada pela Warner Bros. Poderia abordar as oito passagens contadas neste filme de maneira individual, mas não farei isto pois quero me prender na análise técnica e fazer algumas considerações sobre a inspiração do diretor.
Certa vez o crítico de arte alemão Franz Roh considerou o movimento Neue Sachlichkeit como um exemplo de “realismo mágico”. Mal ele sabia que seu termo seria cunhado e utilizado em quase todas as formas de arte. Dreams quebra as barreiras do aceitável justamente por tratar de forma muito subjetiva a visão de mundo do inconsciente do diretor. Alguns críticos dos Estados Unidos atacaram duramente Kurosawa por desfragmentar seu filme e se preocupar mais com a construção dos cenários e com a fotografia. Ora, desconheço qualquer metodologia para interpretar longas relacionados a sonhos. Qualquer tipo de análise que visa atacar a falta de empenho, por exemplo, me parece absurda. Qual a base que temos para comparar Dreams?
Entender a proposta do diretor, no entanto, não torna o longa necessariamente bom. As três primeiras histórias do filme são lindas e bem trabalhadas, mas é impossível não sentir a queda de desempenho a partir da metade final. A combinação entre o real e o imaginário com o folclore japonês (como Yūrei, Yuki-onna e Kitsune) confundem bastante o espectador ocidental, tão acostumado a ver traços de Hollywood na filmografia de Kurosawa. A excessiva busca por sentimentos em um ambiente imaginário me deixou com uma pulga atrás da orelha: qual era o real objetivo de Akira? Digo isto pois os segmentos finais (que tratam sobre um cenário apocalíptico pós desastre nuclear e sobre a valorização da simplicidade da vida) me pareceram forçados ao extremo para buscar indignação onde não existe nenhuma base para a mesma.
Um filme de fantasia com um conteúdo bastante precário? Ou uma obra de arte sobre a subjetividade do homem? Enquanto estas conclusões só podem ser tiradas pelos espectadores, não se pode negar a beleza estética de Dreams. Aliado a uma edição e produção de primeiro nível (com a participação de George Lucas e Spielberg) e com uma curiosa atuação de Martin Scorsese como Vincent Van Gogh, as cores vibrantes tornam este longa uma boa pedida para um dia chuvoso.
NOTA: 7/10
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