Mudbound (Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississippi, no Brasil) estreou em Sundance 2017 com muita expectativa. Foram várias ofertas para comprar os direitos do filme nos Estados Unidos – e uma espécie de leilão entre A24, Annapurna e Netflix logo se formou, muito pelo fato de ser o longa com mais potencial para premiação do festival. Como a Netflix acabou adquirindo os direitos do filme na maior parte do mundo (a Diamond comprou o filme no Brasil) – uma grande questão surgiu: será que a Academia deixaria de lado este filme, assim como ocorreu como Beasts of No Nation – apenas pelo fato de ser um filme lançado diretamente via streaming, com lançamentos pontuais em NY e Los Angeles apenas para “cumprir tabela”? Com quatro indicações ao Oscar, incluindo a histórica nomeação de Rachel Morrison, primeira mulher a disputar o prêmio de melhor fotografia, Mudbound conseguiu quebrar a primeira barreira dentro da Academia na relação cinema – streaming. Adaptado do romance homônimo de Hillary Jordan, o filme dirigido por Dee Rees acumula erros e acertos ao longo de seus 130 minutos de duração.
Mississippi, década de 1940. O casal Henry e Laura (Jason Clarke e Carey Mulligan) tentam mudar de vida. Eles pensam que compraram uma fazenda, mas na verdade descobrem que devem viver em uma pequena casa e trabalhar para comer. Junto deles está Pappy (Jonathan Banks), o típico sulista racista comum nesse período. Na fazenda eles criam contato com a família Jackson, composta por Hap (Rob Morgan), Florence (Mary J. Blige) e seus quatro filhos, que sofrem diariamente com o preconceito. No contexto da Segunda Guerra Mundial, as duas famílias também partilham a esperança do regresso de seus queridos após a derrota do Eixo. Jamie (Garrett Hedlund), irmão de Henry, serviu como piloto, enquanto Ronsel (Jason Mitchell), filho de Hap e Florence, foi piloto de tanque.
A partir da volta dos dois heróis de guerra para casa existe uma grande reflexão sobre racismo na sociedade estadunidense na década proposta no recorte cronológico, ainda mais tendo em conta que o Mississippi historicamente foi um dos territórios mais racistas dos Estados Unidos. Ao mesmo tempo que Ronsel sente o novamente preconceito que não sentia na Europa, sua amizade com Jamie não é aceita por nenhum outro branco.
O drama das duas famílias, explícito em arcos narrativos secundários variados, unem-se em um final muito bem trabalhado. Dee Rees manteve pequenos erros históricos do livro original, mas o principal problema está na forma como conduz seu desfecho para tentar sustentar as expectativas criadas no epílogo. Ainda assim, existe um excelente trabalho de fotografia que merece ser destacado, ainda mais tendo em vista que estamos falando de um filme independente de baixo orçamento.
É impossível não traçar um paralelo direto entre filmes como Mudbound e clássicos como Places in the Heart (Um Lugar no Coração), por exemplo. Nos últimos anos, os diretores tentam ampliar o escopo de seus filmes para tratar também de questões políticas contemporâneas – o que é louvável. No entanto, isso não pode ser feito às custas do inchamento do roteiro. Faltou um pouco mais de objetividade para Mudbound ser o que Places in the Heart foi na sua década.
NOTA: 7/10