Com o recente fracasso de Magic in the Moonlight, com Irrational Man (O Homem Irracional, no Brasil) Woody Allen busca retomar sua tradicional linha de comédias negras. Com um elenco conceituado, e uma boa produção, o filme esbarra na comparação direta com duas produções recentes de Allen – Midnight in Paris e Blue Jasmine – e, mesmo com um excelente sentimento de progresso, não recompensa o espectador da mesma forma como nas produções citadas por envolver um tema complexo.
No seu 45º filme, Allen volta as raízes e coloca novamente um protagonista como um anti-herói. Utilizando um recurso de roteiro que lembra muito o seu clássico drama existencial Crimes and Misdemeanors e até mesmo o mais recente Cassandra’s Dream, o diretor dá a chance para Joaquin Phoenix brilhar como Abe, um professor de filosofia que passa por uma profunda crise pessoal. Sem objetivos para sua vida, cada dia é vivido na mesma rotina de álcool, aulas e decepções. Em processo de mudança para uma pequena cidade, sua aluna Jill (Emma Stone) acaba se interessando pela curiosa vida deste homem, que resiste a um relacionamento com a moça de todas as formas. No entanto, Allen acaba tendo um caso amoroso com Rita Richards (Parker Posey), colega professora que anda descontente com seu casamento. Mas isto não é motivo para Jill de seu professor. Ela deixa seu namoro de lado e investe todo seu tempo em passeios e encontros com Abe.
O professor acaba ganhando um motivo para viver após ouvir junto de Jill em um restaurante uma conversa em que uma mãe desesperada busca a guarda permanente de seu filho. O problema é que neste caso a justiça não seria feita, pois o marido dessa mulher tinha ao seu lado um juiz corrupto para garantir a vitória neste caso. É então que Abe tem um desbloqueio instantâneo: em sua cabeça, caso alguém assassinasse o juiz deste caso, o mundo se tornaria um lugar melhor, pois uma cadeia de eventos garantiria a justiça para aquela mãe. Por conta disso, ele arma um plano perfeito para matar este homem, já que ele estaria acima de qualquer suspeita e não teria ligação nenhuma com o caso. Ao mesmo tempo que ele retoma sua vida normal, Abd acaba cedendo a pressão e assume um relacionamento com Jill, o que pode lhe custar caro.
O grande diferencial deste longa é a questão filosófica por trás do título. Longe de ser apenas uma alegoria, Allen dá várias pistas para que o espectador consiga entrar por completo na discussão que dá razão ao filme. Homem Irracional é o nome do livro de William Barrett que busca tratar sobre o existencialismo. Allen dá voz a Barrett quando coloca Abe para discutir em suas aulas nomes como Dostoevsky, Heidegger, Kant e Simone de Beauvoir – todos estes estavam preocupados em algum momento de suas carreiras em entender o sentido da vida e do mundo. Abe diz que essas discussões teóricas são bobagens, e é justamente por isso que ele busca colocar na prática a razão e a moralidade através do assassinato do corrupto juiz. Assim como em outros filmes de Allen, o crime está envolto em um contexto de destinos cruzados por acaso, através de circunstâncias extremas e inesperadas, ressaltadas na cena decisiva do longa.
A atuação de Phoenix mais uma vez é o ponto alto. Assim como em Inherent Vice, ele interpreta com perfeição um homem constantemente sobre influência de entorpecentes. Ainda que Emma Stone não convença como protagonista – o papel parece ser muito maduro para ela – no geral o elenco de apoio consegue segurar as pontas. A trilha sonora impecável dá um tom extremamente positivo ao andamento, e mistura muito bem a tensão, o clima de romance e o mistério que envolvem o personagem de Phoenix.
Por mais que o roteiro inicial seja de simples compreensão, Irrational Man é um filme complexo que propõe uma longa discussão sobre moralidade. Por este motivo não deve ser comparado com outras produções recentes de Allen, pois os objetivos são abertamente diferentes.
NOTA: 8/10