Para o sucesso de um documentário, é necessário espaço para a controvérsia. No caso de uma acusação, espaço para a defesa. No caso de Leaving Neverland (Deixando Neverland, no Brasil) – os sentimentos são diversos. Afinal, são quatro horas de acusações muito sérias. Se é verdade que as vítimas devem ser ouvidas em qualquer caso, a presunção de inocência também deve ser considerada.
O diretor Dan Reed é muito claro e direto: não existe uma prova incontestável para dizer que Michael Jackson foi um pedófilo. A partir disso, o que ele usa para montar sua narrativa é o depoimento de Wade Robson e James Safechuck, que contam sobre abusos cometidos por Michael durante durante um longo período de tempo.
A estruturação – questionável – prega a fiabilidade do depoimento dos dois para colocar uma mancha no legado de Jackson. Algumas respostas são duras e tristes. Para ilustrar e dar um contexto sobre a relação dos dois, a equipe também entrevistou as famílias, que contam como deixaram Michael se aproximar dos jovens e como acabaram iludidas pela fama e pelo dinheiro.
As acusações não são novas. Os fãs de Jackson sabem das polêmicas anteriores e questionam o fato de que Wade, por exemplo, trocou a narrativa várias vezes nos últimos vinte anos – incluindo uma defesa de Michael sob juramento. A vontade de Reed condenar Jackson infelizmente acaba fechando sua perspectiva a ponto de sequer considerar o questionamento e a possibilidade de que os dois estejam mentindo ou alterando mais uma vez suas histórias. Não existe espaço para defesa da família de Jackson. No total, são 3 horas e quarenta minutos de ataques pesados e vinte minutos finais de reconhecimento da equipe de que o depoimento deles deve gerar muita controvérsia. A conclusão é forte: Michael foi um pedófilo e deve ser reconhecido como tal. Por conta disso, a produção toma um caminho parcial e não reconhece investigações da justiça estadunidense e do FBI, por exemplo – basicamente jogando na tela apenas itens contra Michael.
Leaving Neverland chega ao Brasil também com a divisão em duas partes (a primeira no dia 16 de março e a segunda no dia seguinte, na HBO). Já é um dos documentários mais polêmicos dos últimos tempos e deve reacender uma enorme discussão nos Estados Unidos. Se pode ser relevante na questão que aborda, falha como documentário – no sentido mais amplo deste nobre gênero.
NOTA: 6/10