The Girl on the Train (A Garota no Trem, no Brasil) tinha tudo para ser um filme de sucesso. A novela original de Paula Hawkins vendeu milhões de cópias ao redor do mundo, com aclamação da crítica literária. O anúncio do filme com direção de Tate Taylor chegou até mesmo a estabelecer um parâmetro de comparação com Gone Girl, já que nos dois casos temos tramas construídas com muita tensão em torno de um grande mistério. Mas é justamente no roteiro, principal acerto da equipe de David Fincher, que mora o pecado que torna o longa de Taylor em uma decepção. Gone Girl teve a história adaptada pela própria autora do livro base (Gillian Flynn), enquanto Hawkins não esteve envolvida em nenhum momento na produção. O resultado, ainda que previsível, é desagradável: desconstrução temporal, falta de coerência na narrativa e um timing no mínimo controverso que prendem à força o espectador para uma conclusão apressada.
Rachel Watson (Emily Blunt) é uma alcoólatra que passa boa parte de seu tempo dentro de um trem. Sentada na janela, ela observa a casa de seu ex-marido, Tom Watson (Justin Theroux), que estabelece uma nova família. Em dois anos, sua vida se tornou um inferno, e a mulher parece não ter o mínimo controle emocional. É também da janela do trem que ela observa cenas da vida de Megan (Haley Bennett), que parece viver uma vida dos sonhos com seu parceiro (Luke Evans). Quando Rachel flagra uma suposta traição de Megan, ela passa a questionar a ação da moça, com sérias consequências na vida de todos os envolvidos.
O grande mérito do livro está no uso de narradores não confiáveis, que estabelecem uma referência argumentativa que logo é desconstruída com o desenrolar do caso. Era esse o fato que me preocupava, e por este motivo considero que o roteiro adaptado por Erin Cressida Wilson deixou escapar uma oportunidade imensa de convencer através das mentiras. O filme é rodado a partir de flashbacks, que não conseguem mostrar a ideia de memórias – ou memórias alteradas. Para quem não leu Hawkins, parece um filme picotado, que abusa do anacronismo temporal para apontar culpados.
Gosto muito do trabalho de Emily Blunt, mas considero que seu papel foi extremamente forçado. Outra oportunidade perdida para tratar sobre os problemas do alcoolismo, já que suas recaídas tem pouco conteúdo (e mesmo no final, quando tudo parece tomar outro caminho, nada disso volta a ser tratado). A maquiagem pesada busca traços brutais em expressões faciais que não acompanham o contexto proposto. Ainda assim, a atriz dá seu máximo para levar ao público seu melhor.
The Girl on the Train tinha potencial para ser uma das grandes surpresas de 2016. Infelizmente não é – e passa longe até mesmo de ser uma opção viável de entretenimento. São tantas coisas erradas na construção do filme que fica visível a ideia de que a Dreamworks e a Universal apressaram a adaptação para conseguir aproveitar a imensa popularidade da história publicada no ano passado.
NOTA: 6/10