Troca de olhares. Nenhum filme europeu é tão dependente da análise das interpretações faciais como La piscine (A Piscina, no Brasil), clássico dirigido por Jacques Deray que voltou a ganhar popularidade com o recente lançamento de A Bigger Splash. O que torna o filme estrelado por Alain Delon ainda mais impressionante é a direção do roteiro, que sabe mesclar a sensualidade com drama de forma invejável, muito diferente do que era apresentado em sua época de produção pelos diretores de Hollywood.
Jean-Paul (Alain Delon) e Marianne (Romy Schneider) estão de férias na charmosa Saint-Tropez, em uma bela casa com uma grande piscina. O período para descanso é tão positivo que Jean-Paul chega a cogitar se mudar definitivamente para um local com tamanha tranquilidade. Certo dia, Harry (Maurice Ronet), ex-namorado de Marianne e antigo amigo de Jean, liga para o casal e decide fazer uma visita junto de sua filha, Penelope (Jane Birkin), uma exuberante moça de dezoito anos que logo desperta o interesse de Jean-Paul. A visita, no entanto, ganha outros traços a partir do momento em que Harry e Penelope decidem ficar mais dias junto do casal.
A ousadia de Deray pode ser compreendida desde o primeiro minuto. Os corpos de Delon e Schneider são expostos com extrema naturalidade. Beijos apaixonados ou mesmo um topless à beira da piscina são retratados de ângulos que colocam o espectador como um observador ativo em segundo plano. Diversos segredos são escondidos até mesmo do público – e o sucesso de La Piscine está justamente na necessidade de ler com antecedência algumas ações inesperadas para entender o poder de impacto que tal fato terá na sequência.
Os olhares ditam o sucesso e/ou fracasso de todos os personagens envolvidos. Desde cedo, toda a edição comandada por Paul Cayatte privilegia rápidos cortes que demonstram a reação perante situações constrangedoras. O clima amigável aos poucos é deixado de lado, e uma intensa disputa entre os dois homens toma lugar. Inicialmente, o foco volta-se para Marianne. Em uma das cenas mais importantes do filme, Jean-Paul e Harry disputam na piscina sob os olhares da mulher para ver quem nada mais rápido, como se ambos quisessem provar sua superioridade (tal passagem foi brilhantemente adaptada por Guadagnino em A Bigger Splash, por sinal). Na metade final, Penelope torna-se o centro das atenções – e mesmo que Harry consiga aceitar a ideia de conquistar novamente a mulher de seu amigo, não consegue lidar com o fato de que ele possa ter qualquer tipo de relação sexual com sua menina.
Delon, no auge de sua carreira, entrega uma atuação segura e eficiente. A partir do momento em que a trama ganha traços misteriosos e dramáticos, a personalidade de seu personagem parece se moldar ao estilo de Jef Costello em Le samouraï (extremamente quieto, frio e calculista). A versão em Blu-Ray conta com uma nova transferência em 1080p, com uma qualidade incrível que ressalta o belo contraste da fotografia de Jean-Jacques Tarbès. Além disso traz a curiosa versão final exibida da Espanha – que apresenta um final diferente por conta da pesada censura do regime Franco. La Piscine também incomodou os distribuidores dos Estados Unidos, que enfrentaram dificuldades para lançar o filme fora da faixa da meia noite pelas cenas provocativas e pelas passagens de nudez frontal – e ganhou o status cult graças as exibições proibidas em pequenos clubes.
NOTA: 7/10