Lyndon Johnson é um dos políticos mais controversos da história recente dos Estados Unidos. Só mesmo um ator do nível de Bryan Cranston para conseguir levar ao público um retrato fiel do homem que assumiu a presidência após o assassinato de Kennedy e implementou uma agenda que mudou completamente o panorama político do país. All the Way (Até o Fim, no Brasil) é uma produção da HBO baseada na peça homônima da Broadway que conquistou os EUA – e merece todos os louros pela adaptação incrível e pelo trabalho impecável junto de historiadores para tentar começar a entender quem realmente era Lyndon Blaines Johnson.
Seguindo a temporalidade definida na peça, o filme começa com o Lincoln Continental de Kennedy ensanguentado, em novembro de 1963. Na cena a seguir, Johnson (Cranston) já é o presidente dos Estados Unidos, e observa junto de sua esposa, Lady Bird (Melissa Leo), Jackie incrédula dentro do Air Force One com seu vestido Chanel rosa, também com sangue de seu marido. Pelo período de um ano (antes de vencer a eleição de 1964 com larga vantagem) – acompanhamos Johnson desafiar a base de seu próprio partido ao colocar em prática a proposta de Kennedy para acabar com a segregação racial nos Estados Unidos (o que faria seu partido perder toda a base de apoio dos estados do sul consolidada desde a Guerra Civil).
Pouco antes de falecer, Richard Nixon considerou Lyndon Johnson como um dos três maiores políticos do século XX (junto de Teddy e Franklin Roosevelt). Ao mesmo tempo, reconhecia o instinto animal de Johnson – expressado em sua necessidade de ter cada vez mais poder. Ainda, segundo Nixon, Johnson morreu cedo justamente por não saber lidar com a falta de poder pela primeira vez em sua vida. É seguindo essa linha que All the Way torna-se em um produto televisivo da mais alta qualidade. O diretor Jay Roach (que repete a parceria com Cranston após Trumbo) consegue abrir ao seu espectador uma longa discussão entre a fina linha que separa a moralidade do poder, e como o jogo político cria suas próprias leis internas.
Robert Caro é um acadêmico que passou boa parte de sua carreira estudando Johnson. Desde 1982, temos quatro livros impressionantes que contam a ascensão do político no Texas – através de métodos sujos – para chegar à liderança do Senado. O maior feito de All the Way é saber fazer a mediação deste Johnson que é apresentado por Caro com aquele que as pessoas estavam acostumadas a assistir nos pronunciamentos televisivos na década de 1960.
Bryan Cranston merece um Globo de Ouro e um Emmy por sua interpretação. Quem viveu com o presidente Johnson sempre relatava certo constrangimento por conta do chamado ‘Johnson Treatment’ – uma técnica de persuasão do político que envolvia gestos, gritarias e contato físico. All the Way explora este método a partir de cenas em que LBJ discute com Luther King (Anthony Mackie) e com o Senador Richard Russell (Frank Langella)- os dois principais coadjuvantes de All The Way, sobre o esboço do documento que seria levado ao Congresso como Lei dos Direitos Civis de 1964.
O impressionante elenco de apoio impressiona. Nomes da política como o assessor de LBJ, Walter Jenkins (Todd Weeks), envolvido em um escândalo homossexual em 1964, o diretor do FBI, J. Edgar Hoover (Stephen Root), e o líder da ala liberal dos democratas, Hubert Humphrey (Bradley Whitford) dão uma boa dimensão das negociatas para LBJ conseguir seus objetivos. Como proposta da peça, infelizmente o cenário externo fica de lado, com breves passagens sobre a União Soviética e sobre a investida no Vietnã.
All the Way é, sem sombra de dúvidas, um dos melhores filmes feitos para a TV deste milênio. A atuação de luxo de Cranston apenas coroa uma produção que já era consagrada no teatro. Mérito da HBO.
NOTA: 9/10