Indicar The Autobiography of Nicolae Ceausescu para alguém que não conheça a história da Romênia é um erro gravíssimo. A primeira vista, o documentário é apenas uma coleção solta de imagens sobre a vida de um dos ditadores mais temidos do continente europeu no século XX. Mas para quem tem conhecimento dos horrores vividos pelos romenos, a produção dirigida por Andrei Ujica ajuda a entender como a manipulação é um fator chave para controlas as massas, especialmente em sistemas autoritários.
Com três horas de duração e sem narração, o filme aproveita da New Wave romena para revolucionar a forma com que visa contar sua história. Reunindo gravações recolhidas da televisão estatal, o foco não é contar a vida de Nicolae Ceausescu, muito menos os altos e baixos de seu governo. O que está em análise aqui é a forma com que o ditador aproveitou vários episódios ao longo de seus 24 anos no poder para consolidar sua imagem.
Ceausescu esteve junto dos maiores líderes mundiais de sua época. Desde os encontros com os presidentes americanos Richard Nixon e Jimmy Carter até as conversas ao pé do ouvido com o Secretário Geral da União Soviética Leonid Brejnev, o ditador romeno tentou tirar o máximo de proveito para se firmar como um socialista ‘diferente’. Após visitar Mao, na China, e Kim Il-sung, na Coréia do Norte, ele começou a trabalhar em torno de um forte culto a personalidade.
Por isto assistimos a sua autobiografia – a imagem transmitida pela TV romena vendida ao público. A miséria e as gravíssimas crises financeiras não chegam a ser tradadas por um segundo. No mundo pessoal do ditador, nada disto existia, já que a Romênia era o exemplo perfeito de uma democracia. Para provar isto ao mundo, ele fazia questão de visitar supermercados recheados de alimentos, mesmo que a realidade fosse outra. Mesmo quando um membro do Partido Comunista do país questionou sua autoridade, em 1979, Nicolae Ceausescu contou com o apoio massivo de milhares de delegados, que trataram de minimizar o caso. Sua mulher, Elena, número dois do país e alvo de absurdas políticas, tem sua imagem pouco explorada, o que é compreensível.
Reafirmando o que disse no primeiro parágrafo, é por este motivo que é extremamente necessário um conhecimento prévio da realidade romena. A autobiografia tem um final inconclusivo – ela termina com a mesma cena que começa o documentário, com Ceausescu sendo julgado e defendendo seus ‘valores’. Existem pequenos erros de continuidade, já que a proposta do filme é contar a história do ditador de forma linear tão logo a primeira cena é finalizada, mas nada que comprometa.
Filme essencial para estudantes de política e também para os interessados em estudar manipulação de massas, The Autobiography of Nicolae Ceausescu é um documentário poderoso – em todos os sentidos – mas é para um público extremamente restrito.
NOTA: 8/10