Se você perguntasse para dez pessoas de Hollywood qual era o documentário mais esperado de 2015, ao menos oito delas apontariam para Listen to Me Marlon. Marlon Brando até hoje é um personagem enigmático. Dono de uma carreira de altos e baixos e considerado por muitos como o melhor ator da história do cinema (me incluo nessa, por sinal), sua vida privada extremamente fechada e recheada de polêmicas foi alvo de programas, revistas de fofoca e diversos livros. Da boca de Marlon se ouvia pouco, muito pouco.
É por este motivo que Listen to Me Marlon é encantador. Stevan Riley conseguiu acessar a coleção privada de áudios de Brando e construiu (ou reconstruiu, dependendo da visão do espectador sobre o ator) a vida de Brando, combinando com entrevistas e cenas de seus principais filmes.
“Minha cabeça foi digitalizada”. Com uma voz de surpresa de Brando, o documentário busca este episódio isolado da década de 1980 para apresentar o protagonista ao seu público. Fora o principal escândalo da vida de Marlon – a morte do namorado de Cheyenne Brando após uma discussão com seu irmão, Christian, na casa da família – a produção segue uma previsível linearidade, que valoriza a história de vida do ator até mesmo para quem sabe pouco sobre ele.
Inicialmente, Listen to Me Marlon projeta a personalidade do ídolo a partir de seus graves problemas com seu pai, que tinha sérios distúrbios comportamentais, e com sua mãe, descontrolada por conta do alcoolismo. A partir dos áudios de Brando, descobrimos sua visão sobre a chegada dele em Nova York: ‘cheguei lá com furos nos bolsos e na minha cabeça’. A redefinição de como o ator se comporta diante das câmeras foi bem discutida. O próprio Brando diz claramente que buscava se afastar dos padrões de Gary Cooper ou Clark Gable. Na sua visão, o público iria para o cinema sabendo de antemão o que esperar de suas atuações. O nome do personagem mudava, mas a interpretação não. Por isso, a influência ímpar de Stella Adler em sua vida é retratada de forma bem intensa. Entender ‘O método’ não é apenas requisito para compreender as atuações de Brando, mas também para ter a clara noção do quanto esta revolução influenciou uma nova geração de atores.
“Quando eu era jovem, era muito atrativo”. Em uma passagem rodeada de clipes de A Streetcar Named Desire – muito bem articulado, diga-se de passagem, Brando trata de seus primeiros passos no cinema. O diretor aproveita a deixa e trás para análise a questão pessoal, a estrela macho do ator e sua postura dominante. Várias são as revelações: Brando não gostou de sua atuação em On the Waterfront, chegou a colocar em dúvida se poderia mesmo interpretar Don Vito em The Godfather e admitiu que participou de vários filmes apenas pelo dinheiro, para manter seu padrão de vida. Sobre a conturbada relação com Ford Coppola em Apocalypse Now (alvo de Hearts of Darkness: A Filmmaker’s Apocalypse), Brando mostrou-se chateado por ter sido traído pelo seu amigo.
Listen to Me Marlon é uma pérola para os fãs do ator. No entanto, nota-se um completo descaso com a filmografia do final de sua vida (não existe sequer uma menção!) e mesmo com seus problemas pessoais. Para evitar polêmicas com a família, Riley adotou um tom moderado e não deu espaço para nenhum tipo de discussão. Ainda assim, um grande documentário sobre uma lenda do cinema.
NOTA: 8/10