Durante a era dos estúdios, Detour (A Curva do Destino, no Brasil) foi uma das boas surpresas do pequeno cinema independente dos Estados Unidos. Com um orçamento extremamente apertado e com apenas 14 dias de filmagens na base da improvisação, o diretor Edgar G. Ulmer trouxe ao público uma grande história no melhor estilo film-noir. Após a assistir este longa, não tenho dúvida alguma de que este longa seria muito mais propagado caso a RKO ou a Paramount se envolvessem em alguma etapa da produção ou até mesmo na distribuição.
O pianista Al (Tom Neal) está descontente com o rumo de sua vida. Ele acaba de descobrir que sua namorada irá sair de sua cidade para tentar a vida como atriz em Hollywood. Certa noite, Al decide ir atrás de sua garota. Sem dinheiro, ele para na estrada para pedir carona. O apostador Charles Haskell Jr. (Edmund MacDonald) ajuda Al, mas morre após dar a direção de seu veículo para o homem. Desesperado, ele toma a identidade de Charles para seguir viagem, mas logo encontra a femme fatale Vera (Ann Savage), que coloca Al na parede ao dizer que sabia que Charles era o dono do carro e das vestimentas do pianista.
A narrativa é extremamente interessante. As cenas são contadas por flashbacks, mas o narrador do filme é o subconsciente do protagonista principal. A tocada do longa é muito rápida e não deixa a desejar. Mas os pontos positivos param por aí. É visível a falta de recursos desde a caracterização dos cenários. Os atores não convencem, e Neal, um boxeador amador que conseguiu seu papel em troca de alguns trocados, fica preso no tradicional melodrama propagado pela indústria estadunidense deste período.
O expectador pode perguntar: mas porque Detour é considerado hoje como um cult classic? A resposta não está no filme em si, mas na coragem da pequena equipe em colocar uma produção de baixo orçamento em um mercado extremamente competitivo. Se por um lado a narrativa diferencia-se do que os espectadores estavam acostumados a ver, não podemos deixar de mencionar o grande poder da censura no cinema. Detour sofreu cortes, edições e teve seu final alterado por conta do Motion Picture Production Code. Em um caso emblemático, Ulmer foi convocado para prestar explicações em Washington por conta da cena final de seu longa (spoilers adiante!). Apesar de Al não ter premeditado nenhuma morte, os agentes do governo não achavam certo ele gozar da liberdade na última cena. O diretor então modificou a última tomada, onde um carro da polícia recolhe o protagonista. Será que ele foi preso? Ou será que eles iriam apenas dar uma carona para Al? As perguntas deixadas no ar foi a forma encontrada para sair do tradicional “esquema de Hollywood”, que dizia que um filme teria que ter um começo e um final claros para compreensão das audiências. Na verdade, você pode questionar tudo, até mesmo se Al não foi o real assassino de Haskell e de Vera.
Detour foi o primeiro filme B selecionado pela Livraria do Congresso estadunidense para preservação. Hoje ele está em domínio público e vale a pena conferir aquele que também é o filme favorito de Errol Morris.
NOTA: 6/10