Qualquer lista séria dos dez melhores filmes da história do cinema deve incluir Shichinin no samurai (Os Sete Samurais, no Brasil). Faço esta constatação tendo em conta tudo o que este longa dirigido por Akira Kurosawa representa não só na forma de como tocar uma narrativa, mas também pela estética e padrões de comportamento de seus personagens.
No século XVI, período da era Sengoku, uma indefesa comunidade sofre com os constantes saques de bandidos. Os moradores da região pedem ajuda a Kambei (Takashi Shimura), um veterano guerreiro, para poder organizar uma resistência aos quarenta homens que fazem daquele vilarejo um verdadeiro inferno. Kambei então decide recrutar samurais que aceitem trabalhar em troca de três refeições completas e organiza uma estratégia para deter mais destruição. Em paralelo, acompanhamos as histórias de Katsushiro (Ko Kimura), um dos samurais escolhidos que acaba se envolvendo com uma jovem camponesa e Kikuchio (Toshiro Mifune), guerreiro traz uma pitada de humor ao longa.
Curiosamente o primeiro filme de samurais de Kurosawa foi mal recebido na imprensa japonesa. O diálogo final “então, novamente somos nós os derrotados. Os camponeses venceram, não nós”, deu a impressão de que o longa estava incompleto. Acredito que eles não entenderam a grandeza do filme, o que é compreensível. Aos poucos a marca do roteiro de Kurosawa atravessou fronteiras até a chegada aos Estados Unidos com o remake The Magnificent Seven, de John Sturges. Somente em 1960 ficou claro que Os Sete Samurais era um daqueles filmes a frente de seu tempo (tenho várias ressalvas quanto ao uso desta expressão, mas não vejo oportunidade melhor para usá-la do que esta).
O grande diferencial desta película foi focar a história em um pequeno grupo de pessoas e contar como as pessoas que os rodeiam são influenciados pelas suas ações e planos. A duração do filme ajuda muito a compreender o contexto da região, os medos e desejos dos moradores de maneira poucas vezes vista no cinema até hoje. Apesar do longa de Sturges se manter fiel a história de Kurosawa, a adaptação ao velho oeste americano simplesmente deixou de lado elementos chave como a análise psicológica dos personagens e a consequente criação de uma certa intimidade entre o espectador com os protagonistas. O resultado foi um agradável longa, mas com um enfoque totalmente diferente do proposto por Kurosawa. Sturges buscava uma criar um bom western; já o ambicioso japonês mesclou elementos de sua milenar cultura para tratar sobre honra e tradição.
Aliás, sobre este último aspecto não posso deixar de mencionar a excelente produção por trás da história principal. Não apenas a fotografia e os cenários são belos, mas toda a pesquisa em torno da cultura japonesa foi feita de forma majestosa. Tanto é que vários acadêmicos abordam sobre conceitos como imaginário e representação através da exibição deste longa. O uso da pólvora como instrumento para morte e a ruptura com o modelo de que o sangue só corria pela espada foi bem explorado por Akira. E, como citei anteriormente, a defesa da honra da comunidade com a ajuda dos samurais é marcante. Desde a criação de uma bandeira de guerra até a crescente preocupação dos guerreiros pelo bem estar da comunidade, quem assiste ao filme fica de boca aberta com a sensação de imersão proporcionada.
207 minutos realmente é um tempo considerável. Originalmente Kurosawa lançou este filme com quase uma hora a menos, mas não demorou muito para as edições restauradas estourarem nos Estados Unidos e na Europa. Este é aquele tipo de filme que você investe na sua cultura pessoal. Clássico!
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NOTA: 10/10