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Sunrise: A Song of Two Humans (Aurora) – 1927

Quantos filmes podem carregar a honra de levar nas costas o prêmio do Oscar de melhor filme? Não basta apenas procurar no Google a lista dos vencedores, mas sim optar por uma corrente de interpretação (sim!). A diferença nos números ocorre graças à premiação feita na primeira entrega de prêmios, em 1929. A Academia criou dos prêmios diferentes: Outstanding Picture (que seria entregue ao filme com melhor história) e Unique and Artistic Production (entregue ao filme mais completo). Enquanto Wings levou o Oscar pela primeira categoria citada, Sunrise: A Song of Two Humans (Aurora, no Brasil) levou o prêmio de produção. E ai começa a discussão. Considerar Sunrise como ganhador do Oscar de melhor filme ou não? Cada crítico tem sua opinião. Os que acham que não, que Sunrise não pode ser considerado como vencedor do Oscar de melhor filme, geralmente citam a decisão tomada pela Academia em 1930, quando  Louis B. Mayer decidiu dar apenas o prêmio para melhor filme e deixou de lado o prêmio para produção, citando que Wings havia recebido o prêmio máximo no ano anterior. Quem considera Sunrise merecedor do prêmio argumenta que as cédulas de votação distribuídas para os membros votantes em 1929 não diferenciava ou dava importância maior para uma ou outra categoria. Em todo caso, vou considerar a opinião de Ebert, Gene Siskel e Roeper. Sunrise divide as honras de 1929 com Wings. Fim da discussão. Esse é o filme que vou avaliar aqui.

Vamos lá. Quer fazer um filme agora? Pegue seu iPhone, tablet, celular. Fácil e rápido. Em 1929, as câmeras de cinema eram verdadeiros trambolhos. Gravar uma tomada exigia paciência e cuidado. Os gastos com edição eram muito altos. Como este é meu primeiro review de um filme mudo neste blog, quero escrever um pouco sobre métodos de avaliação. Como classificar um filme deste tipo? Anos atrás assisti a um episódio bem antigo do programa At the Movies onde um espectador perguntava quais eram os critérios que Siskel utilizava para dizer que um filme mudo era bom ou ruim. O apresentador ficou meio sem jeito, e elaborou uma complexa resposta, onde citava que o conhecimento do contexto histórico do período, das técnicas de filmagem, das formas de casting e das tendências da época deviam ser analisadas com muito cuidado antes de avaliar X ou Y.

É muito difícil você dar um filme como Sunrise para uma pessoa que não é fã de cinema e perguntar se ela gostou do que viu. O que pra nós hoje pode parecer uma história sem sal, em 1929 era divulgada como “a mais bela história de amor de nossos tempos”. Após o estouro de The Artist (2011), muita gente passou a pesquisar mais sobre o cinema mudo, mas pelo que acompanho nas boards (IMDB e reddit), dizer que Chaplin é a única coisa boa daquela época é um crime!

Peter Bogdanovich diz que 1927 foi o melhor ano da história de Hollywood. Ora, se os filmes mudos estavam ganhando superproduções (comprovado com Sunrise), os irmãos Warner acabavam de produzir The Jazz Singer, primeiro filme falado da história. Enquanto Wings emocionava o público, Josef von Sternberg dirigia Underworld, primeiro grande filme de gangsters que influenciou o famoso triunvirato do crime (Little Caesar, The Public Enemy e Scarface – assim que acabar a correria do Academy Awards deste ano vou fazer um post sobre este assunto).

Segundo reza a lenda (devo dizer que essas fofocas de Hollywood são ótimas), William Fox ficou impressionado ao assistir Nosferatu, eine Symphonie des Grauens (1922) e Faust (1926), de F. W. Murnau. Com a ideia de levar o expressionismo alemão para os Estados Unidos, Fox deu um cheque em branco para Murnau fazer uma produção com tudo o que tinha direito. E o alemão abusou. Gastou mais de 200 mil dólares para criar uma cidade que foi mostrada em menos de três minutos de filme (e naquela época ninguém era capaz de fazer tamanho investimento. 200 mil equivale a mais de dois milhões e meio de dólares com o ajuste de inflação). Não falei do trambolho à toa. Se vocês notarem, na maioria dos filmes mudos a câmera é presa ao chão. Isto acontecia pois os equipamentos eram pesados, o que impossibilitava o operador de caminhar com o equipamento, por exemplo. Fox contratou Charles Rosher, o cara que mais entendia sobre operações de vídeo naquela época para tentar mexer a câmera em algumas tomadas sem causar o “efeito tremedeira”. Apesar de não conseguir utilizar a técnica durante todo filme, podemos notar algumas tentativas de movimento, especialmente na cena em que o casal anda pela cidade.

Okay, vamos falar da história. Ela é muito simples: um homem (George O’Brien) vivia uma vida feliz com sua mulher (Janet Gaynor), até que uma mulher da cidade (Margaret Livingston) tenta fazer o possível para engatar um relacionamento com o rapaz e fazer com que ele venda sua propriedade. Não quero avançar muito no plot pois existe um twist que dá ares dramáticos a história.

O cinema mudo apostava muito na expressão facial. Em Sunrise, elas são elemento chave para entender o turbilhão de sentimentos que se passa na cabeça do homem. Ficar com sua mulher ou ir para a cidade com sua amante? Atuações impecáveis. Outra coisa que me chamou atenção foi as transições de cena. Justamente pelo fato da mobilidade do cinema mudo ser quase impossível, o diretor tentou suavizar isto com cortes e transposições de imagem muito suaves e agradáveis. Não é uma coisa brusca. Para ficar claro: ao invés de cortar do rosto do homem para o rosto de sua mulher, por exemplo, o diretor buscou harmonizar, cortando do rosto do homem para o mar, e então para o de sua amada. O resultado é ótimo.

Falei sobre algumas revoluções do cinema no ano de 1927. Quase ia me esquecer de citar outra: Sunrise foi o primeiro filme a utilizar a tecnologia Movietone sound system. Apesar de o filme ser mudo, alguns efeitos de áudio foram gravados, como as músicas de uma orquestra e as risadas das pessoas em uma festa. A tecnologia de Fox só não ganhou mais espaço, pois o Vitaphone dos irmaõs Warner virou o queridinho de Hollywood.

Sunrise pode parecer simples, mas é um filme muito ambicioso. O drama disfarçado de romance e com uma pitada de suspense foi um dos grandes filmes da década de 1920.

NOTA: 9/10